[Encontrei por acaso este texto e achei que me descreve na perfeição. Das palavras que podiam ser minhas]
Ano passado, na festa de despedida de uma amiga, ouvia calada e com atenção seu doloroso discurso sobre o quanto ela se preocupava com a decisão de ir embora. Dizia se preocupar com a saudade antecipada da família, com a tristeza em deixar um amor para trás e com a dor de se afastar dos amigos. Ela iria embora para Londres com tantas incertezas sobre cá e lá, que o intercâmbio mais parecia uma sentença ao exílio.
Dentre dicas e conselhos reconfortantes de outras amigas, lembro-me de interromper a discussão de forma mais fria e prática do que gostaria:
“Quando você estiver dentro daquele avião, olhar para baixo e ver todas estas dúvidas e desculpas do tamanho de formigas, voltamos a falar. E você vai entrar naquele avião, nem que eu mesma te coloque nele.”
Ela engoliu seco e balançou a cabeça afirmativa.
Penso que na época poderia ter adoçado o conselho. Mas fato é que a minha certeza era irredutível, tudo que ela precisava era perspectiva. Olhar a situação de outro ângulo, de cima, e ver seus dilemas e problemas como quem olha o mundo de um avião. Óbvio, eu não tirei essa experiência da cartola. Eu, como ela, já havia sido a garota atormentada pelas dúvidas de partir, deixando tudo para trás rumo ao desconhecido. Hoje sei que o medo nada mais era do que fruto da minha (nossa) obsessão em medir acções e ser assertiva. E foi só com o tempo e com as chances que me dei que descobri que não há nada mais libertador e esclarecedor do que o bom e velho tiro no escuro.
Hoje a minha amiga não tem mais dúvida. Celebra a vida que ela criou para ela mesma lá na terra da rainha, onde eu mesma descobri tanto sobre minha própria realeza. Ironicamente – e também assim como eu – ela aprendeu que é preciso (e vai querer) muitas vezes uma certa distancia do ninho. Aprendeu que nem todo amor arrebatador é amor para vida inteira. Que os amigos, aqueles de verdade, podem até estar longe, mas nunca distantes. Hoje ela chama o antigo exílio de lar, e adora pegar um avião rumo ao desconhecido. Outras, como eu, e como ela, fizeram o mesmo. Todas entenderam que era preciso ir embora.
É preciso ir embora.
Ir embora é importante para que você entenda que você não é tão importante assim, que a vida segue, com ou sem você por perto. Pessoas nascem, morrem, casam, separam e resolvem os problemas que antes você acreditava só você resolver. É chocante e libertador – ninguém precisa de você para seguir vivendo. Nem sua mãe, nem seu pai, nem seu ex-patrão, nem sua pegada, nem ninguém. Parece besteira, mas a maioria de nós tem uma noção bem distorcida da importância do próprio umbigo – novidade para quem sofre deste mal: ninguém é insubstituível ou imprescindível. Lide com isso.
É preciso ir embora.
Ir embora é importante para que você veja que você é muito importante sim! Seja por 2 minutos, seja por 2 anos, quem sente sua falta não sente menos ou mais porque você foi embora – apenas sente por mais tempo! O sentimento não muda. Algumas pessoas nunca vão esquecer do seu aniversario, você estando aqui ou na Austrália. Esse papo de “que saudades de você, vamos nos ver uma hora” é politicagem. Quem sente sua falta vai sempre sentir e agir. E não se preocupe, pois o filtro é natural. Vai ter sempre aquele selecto e especial grupo que vai terminar a frase “Que saudade de você…”com “por isso tô te mandando esse áudio”; ou “porque tá tocando a nossa música” ou “então comprei uma passagem” ou ainda “desce agora que tô passando aí”.
Então vá embora. Vá embora do trabalho que te atormenta. Daquela relação que você sabe não vai dar certo. Vá embora “da galera” que está presente quando convém. Vá embora da casa dos teus pais. Do teu país. Da sala. Vá embora. Por minutos, por anos ou para vida. Se ausente, nem que seja para encontrar com você mesmo. Quanto voltar – e se voltar – vai ver as coisas de outra perspectiva, lá de cima do avião.
As desculpas e pré-ocupações sempre vão existir. Basta você decidir encarar as mesmas como elas realmente são – do tamanho de formigas.
Se importa, hoje já fizeste a tua boa ação.
ReplyDeleteAndava mesmo a precisar de ler isto, e se não foste tu que escreveste, foste tu que o colocaste onde eu o pudesse ler.
Tem o melhor dia!
Gostava de ser assim, mais desprendida e determinada ao mesmo tempo. Mas não consigo imaginar-me completamente sozinha num país desconhecido.
ReplyDeleteAdmiro muito a tua coragem, Diana :)
Continua a fazer-nos sonhar com os teus posts! Beijinhos de Portugal**
Ando mesmo a precisar de ler textos assim... como é difícil sair da zona de conforto!!
ReplyDeleteAcho que é igualmente difícil ficar na zona de conforto. Aliás... neste momento acho que é inegavelmente mais difícil ficar em Portugal e tentar fazer uma vida digna e ter um trabalho compatível com as qualificações. Fácil é ir para fora e trabalhar num call center ou como ama longe de toda a gente e viver na ilusão que se é destemido(a).
ReplyDeleteFaz mesmo falta ir embora. Também me revejo completamente neste texto. Obrigada por partilhá-lo Diana, mesmo que não o tenhas escrito. Ao lê-lo voltei a ter 19 anos por uns momentos...viajei até 1996...quando eu também fui embora.
ReplyDeleteBeijinho.
http://thelusofrenchie.blogspot.pt
Concordo! Por vezes é o passo mais difícil de dar, mas tem de ser...
ReplyDeleteQue texto lindo e arrebatador, fantástico mesmo =)
ReplyDeleteParabéns a quem escreveu e a ti que partilhas te, beijinhos **
http://friendshipandstyle.blogspot.pt/
Bem, deixar um amor para trás não me parece uma decisão do tamanho de uma formiga...eu não o faria.
ReplyDeleteApenas concordo no sentido de que ir nos dará, de facto, uma nova perspectiva. No entanto, fui e deixei aqui o meu grande amor. E sim, é verdade, o amor apenas ficou mais forte. Mas não volto a ir sem ele.. nunca.
ReplyDeleteIr embora é uma aprendizagem. E das grandes.
ReplyDeleteCuriosamente, as pessoas à minha volta estão mais assustadas e negativas com a minha partida do que eu :\
ReplyDeleteFoi tão bom ler este texto. Obrigada pela partilha :)
ReplyDeleteVerdade, é preciso ir embora, mas muitas vezes não sabemos muito bem como, ou para onde!
ReplyDeleteÉ preciso ir embora, porque afinal somos nós, e só nós que temos o dom de controlar a nossa vida, ou a forma como queremos que ela seja.
É verdade que a minha vontade de ir embora, sim, os EUA foram sempre a primeira hipótese, é muita. Mas penso, como? Para onde? Estudei a minha vida toda, agora com 29 anos tenho finalmente o estágio da ordem concluído e sou Advogada, e se por um lado gosto de estar aqui, embora a ganhar muito pouco, e a fazer muito mais papel de secretária do que Advogada, sei que é preciso ir embora. Mas não sei por onde começar. Afinal de contas, o meu curso nem é dos mais fáceis para poder emigrar! Mas sim, é preciso ir embora.
Os textos que partilhas são sempre de um estilo muito particular, imagino logo um mexicado de roupa de safari sob um sol tórrido :)
ReplyDeleteDependendo da maneira como é dito isso nem parece tão áspero :)
Está contado de uma forma que se assemelha perigosamente a um conto dos Arrepios :P
É melhor é que a pessoa não tenha medo das alturas :P por muito que possa parecer tudo insignificante também é uma visão avassaladora. Eu acho que a importância da minha família não ia encolher até modo formiga :P
Mas claro que a experiência pode ser muito boa à mesma :) basta ler o teu blog :P
Ei, que frase sublinhada é essa? Haha :P
Claro que as vidas continuam, as coisas continuam. Mas não acho que isso queira dizer que somos todos facilmente prescindíveis... No verdadeiro sentido da palavra não somos insubstituíveis, porque senão o mundo entrava em colapso com qualquer morte. Mesmo assim somos precisos uns aos outros, especialmente os próximos, e há muita gente que fica desolada com a perda de entes queridos. Eu sei que o mundo não parava se eu morresse, mas também sei que não seria o mesmo para muita gente. E nem é egocentrismo, é noção. O mesmo funcionava para qualquer uma das pessoas que me são próximas.
Eu acho que a dor da saudade aumenta com o tempo, senão não faz muito sentido. Se se está sem ver alguém durante 1h é indiferente, 1 dia já pode ser um bocado, 1 semana é muito mais e para sempre mais ainda. Tem lógica :P
...As coisas às vezes não são assim tão fáceis. Há maneiras de fazer as coisas, mas não é tudo tão simples como parece no texto :P
Pré-ocupações é engraçado :P
Se as preocupações são formigas muito mais o é igualmente. Não acho que diminuir as coisas seja a solução, mas talvez esteja errada :)
Gostei do texto, aplica-se imenso a ti ;) Espero que esteja a correr tudo bem aí :D
Juro que adoro o teu blogue! Inspira-me imenso todos os dias! :)
ReplyDeleteNunca pares de partilhar as tuas aventuras, pois elas são incriveis.
E aproveita muito aí em NY ! :)
Beijinhos
Este texto citado foi escrito por ANTÔNIA MACCHI, autora do blog Antônia no Divã O mesmo pode ser encontrado nos registros da Biblioteca Nacional
ReplyDeleteSeria legal consertar isso aí e dar o crédito a quem de direito, não acha?
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